terça-feira, 29 de maio de 2012

Montanhas de verdade ultrapassam o viver

Ele estava com uma doença cronica,
Em seu leito de morte fui o visitar.
" -Não acredito que meu tio esta a morrer!"

Arrastei a cortina branca, e vi meu tio Arnaldo deitado em uma cama quase que inteira branca.
" - Porra, ele odeia esta cor. Sempre tão colorido foi ! Da próxima vez irei lhe trazer alguns baloes para ele  se animar "

-Oi tio...
- Ora ora, se não é meu sobrinho baitola haha. Não ligue para meu estado, tenho uma coisa importante a lhe dizer.
- Diga seu bichinha rs, sou todo ouvidos.
- O legado de tios. Passe-o a dia-a-a-nte.

Aquele silencio me perfurou certeiramente. Enfermeiras quase que em uma maratona entraram no quarto. Uma delas checou seu pulso, virou o dela.
Estava eu carregando agora o legado. Ainda ressoava em meus ouvidos as ultimas palavras coloridas tão quentes como o ultimo punhado de sol da tarde.

 - Vidas mais tarde -


Minha primeira lembrança do meu tio :
Eu tinha uns 4 ou 5 anos na época, tinha acabado de chegar no almoço em família ( e que família ! ).
Olhei para o alto da escada e vi meu tio, com algumas manchas vermelhas na pele e um rosto que não deixava o riso sair por pouco.
- Olha se não é meu sobrinho baitola !
Algo dentro de mim se separou como um amontoado de borboletas e comecou a voar. Eu estava leve e sabia bem oque falar.
Com meu sorriso banguelo por ter comido um sonho respondi :
- Aah sai fora tio! Você que é bichinha !
- E as namoradas ? Aposto que o pipi ja diminuiu bastante !
- Maior que o seu ! Tenho um poste você palito de dente hahaha!

Comecei a correr, ele correu atrás de mim. Me pegou alguns passos depois, levantou minha camisa e começou a assoprar em meu umbigo.
Fiquei rindo feito louco enquanto me remexia feito lagartixa, dando tapas sem querer em seu rosto.
Quando ele parou ouvi uma voz meio grave ao fundo.
- Oi Ronaldo.

O namorado do titio chegou.

                                                    

João Paulo Capovilla Francischini 29.05.2012


segunda-feira, 28 de maio de 2012

Ipê de nós vermelhos


Dizia ela que cor não se via, 
Se reflete do coração para os olhos,
Dos olhos para a vida.

Que vivo era aquele ipê que eu senti à minha frente,
Sentia seus galhos espalhados pelo céu,
E sua semente, germinando e pulsando a vida nele.

Dizia ela que as pétalas vermelhas,
São nós que brincavam nos ventos,
Eram buques de flores livres,leves e soltos.
De casamento eram os buques,
Casamento de vento e chuva, terra e ar.

A lenda dizia que o primeiro nó vermelho 
Foi da alma com a vida, que se entrelaçaram para viverem e refazerem o ciclo
Não importando despedidas, sempre se sabendo que em outros corpos haveria um recomeço.

Que pétala linda que se soltou do galho, 
Dançando com o vento, até ao quase chão chegar.
Um pouquinho de mágica e arrepios para que a pétala levantasse voo,
Apenas um pouco da mágica de duas almas mais velhas que o tempo, 
Tocando o seu talvez primeiro de muitos nós vermelhos. 


João Paulo Capovilla Francischini 28.05.2012


sexta-feira, 18 de maio de 2012

A Igreja de Charlote


Grã Bretanha, por volta de 1800.
A guerra Napoleônica se instalara.
Caos, fome, receios sobre o futuro eram cotidianos.

Charlote, que por volta dos 10 anos perdera os pais,
Invadira um cargueiro e sem rumo pisou pela primeira vez na Grã Bretanha.
Agora com 11, vivia em uma igreja com freis e frades que não foram admissíveis para abençoamento das tropas.
Charlote era pequena, cabelos crespos e encaracolados, sardas quase cor de vinho.
Era quieta, observava sempre as estrelas. Adorava passear saltitante pela Igreja Encosto dos Santos.

A pequena cidade em que fora levada quase como escrava, era cercada por montanhas.
A única igreja da região era a Encosto dos Santos, que se situava entre uma cadeia de montanhas.
As duas maiores montanhas na qual ela se apoiava eram : Eduardo o Confessor e Eduardo o Mártir.

Embora não ligasse para suas roupas escassas, ela sempre se aquecia com um bom livro sobre astrologia.
Era frio, Charlote jurava que seus olhos viravam vidros secos e opacos sempre que saia para passear.

Certo dia quando as estacoes estavam para mudar, o amanhecer apareceu vermelho no horizonte.
Da janela do seu quarto podia se ver o nascer do sol.
Que janela misteriosa era aquela que Charlote imaginava no mosaico, Eduardo o Mártir chorando fogo ao raiar. No principio se assustava e se escondia nos mantos, mas de tempos para cá ela chorava com ele.
Passava o dedo nas pálpebras úmidas e molhava os olhos do santo. E continuava ali até que o sol se levantasse e formasse sua aureola.

Ouviu um barulho ensurdecedor, era hora do café. Se levantou e percebeu as manchas de sangue no colchão. Gritou até que o frei James apareceu. Este era seu preferido, pois tinha olhos folgados e rosto simpático, sempre lhe contava histórias sobre santos porem sua preferida era sobre a taca do Santo Graal.
Desta vez, após um banho colocou-a em seu colo e lhe contou a história sobre a Virgem Maria.

- Virgem como você, vivia em um lugar diferente. Areia se via por todo lado onde vivia. Poucas ovelhas e seus pastores vagavam em busca da vida naquele lugar. Maria tinha sua idade e sonhou com o filho do Criador. Neste sonho recebeu um cálice e o sangue da vida nele despejou. Assim alguns meses após, Nasceu o filho do Senhor, nasceu da vida que emanara do cálice. Nasceu da esperança  na vida que Maria tinha. Assim como você Charlote, Maria era mulher da vida, era filha das estrelas e de seus olhos emanaram o brilho no qual nasceu o amor.

Charlote, se aprofundou no mundo de Maria. Quase nem percebia os carinhosos chamegos do frei em seus cabelos. Charlote adormecera vendo o brilho nos olhos da Virgem.

Ao acordar, correu para a sala de refeiçoes. Rezou, comeu a aveia na tigela de madeira e foi dar voltas pelas vigas da igreja.
Estava uma neve fraca, quase impossível de se acumular. De inteligente que era deduzira : que bom, quando a cortina preta do céu vier, irei ver o luar.

Ao entardecer, correu para o quarto se arrumar para a prometida noite. Eduardo o Mártir estava quieto, rezando como em todas as tardes. Colocou um manto esfarrapado marrom (seu preferido) e foi para o topo da colina.
No jardim que por pouco não tocava o céu conversou com o Mártir e com o Confessor. Contou-lhes sobre Maria e seu sucessor.
Ao anoitecer, a unica neve que caia eram as gotas d'agua das arvores ao redor. Arvores leves e robustas que permitiam Charlote as escalar e o céu ver.
Quando a primeira estrela surgiu, Charlote abriu um sorriso de orelha a orelha. Mas ao perceber a estrela que nascera no dia, viu que era vermelha. Estava morrendo, explodindo, fosse oque fosse, Charlote sabia que era sua ultima noite, embora ainda fosse dia.
Ficou sem esperanças, pois mesmo a estrela com o brilho do ano passado estava a falecer.
Charlote chorou e apareceu a lua, lhe implorou para que fizesse sua querida estrela renascer.
A lua por sua vez iluminou a borboleta : Vermelha, branca e preta. Ela também tinha somente mais um dia de vida, mas estava o usando para Charlote perceber. Nem mesmo as constelações são eternas, Leão, Aquário, Sagitário ... todas viriam a falecer.
Recorrendo ao Santo, pediu com toda forca de suas sardas :
- Mártir, lhe ajudei com suas lágrimas. Sangrei junto a ti.

A noite silenciosa abafou seus pensamentos. Charlote tomou a borboleta as mãos, e sentiu seu vermelho do sangue matutino, viu seu preto do céu acima e penetrou no branco da tristeza da lua.

Então decidiu que aquele seria também seu ultimo dia. Charlote se permitiu ser invadida pela vida.
Viveu intensamente e 9 meses se passaram sua alma. Nos últimos segundos, fez das duas montanhas seu cálice, despejou o sangue da vida, flutuou com a borboleta até a risca do céu, eclodiu e se tornou a estrela prometida.
Charlote, a estrela dos que buscam comida ou família. Era ela agora a minha estrela Dalva preferida.



João Paulo Capovilla Francischini 18.05.2012

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Minhas Putas em vermelho - Neblina angelical

Elizabeth e eu caminhávamos por entre o tempo da vida,
Estava nublado, estava sangrando o céu.E nós,
Bom... nós estávamos respirando as lágrimas de anjos que falharam em proteger.
... nós falhamos primeiro.

Um pouco mais a frente, ao lado da arvore-seca-de-serpentes
Me perguntou :
- O que vai escrever em sua lápide?
- Talvez eu mande desenhar uma seta sem pontas, uma seta redonda. E você?
- Uma garrafa de vinho ...
- Ora bolas. Por que uma garrafa de vinho? Nem alcoólatra você é !
- Não de álcool talvez, mas a vida me embebedou. No meu último sono, querei ficar bêbada também.
- Gosta tanto de dormir assim?
- Todos gostamos nem que por um fatídico dia, fingir um suicídio ao deitarmos na cama.

Fiquei meio abalado por ouvir palavras diretas. Enfim continuamos a andar.
Dei-me o seu braco, me entrelacei a seu sorriso e :
- Nós andamos iguais, nós andamos iguais. De um lado pro outro, pra frente pra trás, nós andam...
-O que foi ? Tava começando a pegar o jeito do seus passos agora poxa.
- Olhe! Achei um pedaço de paixão, semi-novo quase faiscando.
- Chute logo! Esqueceu da regra ? Tem que o chutar para frente, caso contrário vai virar semente.

Assobio do vento, neblina vermelha dando espaço à esperança, baque, assobio decrescente e...

- Ora ora, não é que deu certo ! Caiu em um lago !

O sorriso dela gritava em meus ouvidos. Me agarrou, entrelaçou-se em meu braco :
-Nós andamos iguais, nós andamos iguais...
- Que janela é esta em seu sorriso ? Nunca imaginei que um quadro poderia ser perfeito apenas pela moldura.
- ... De um lado pra outro, pra frente pra trás. Nós andamos iguais! [...] Li em um olhar, que neblina densa forma essas pedrinhas. Não percebe ? Estamos nos afogando enquanto respiramos este ar, estamos nos tornando pedra que ostenta o lar da borboleta que vive um dia, estamos nos tornando aos poucos pedras de amor. Quem irá nos chutar ?
- Que olhar de criança-esperança este que me brota nas orelhas, vejo o som das águas sangrando as paixões latentes deste mundo. Quem irá nos chutar?

Andamos até o lago calmo, posei-me no cume da montanha que dividia realidade e amor. Terra e mar.

Um grito continuo, a neblina dando licença e um molhado que nem peixes podem imaginar.
Eu era sangue, eu era vivo, eu corria por entre meus órgãos vitais.
Não era mais um simples nicho, o rio que eu nadara era um Mar !

-Agora venha Lizzy, mande-me um beijo e vamos nadar!
- Não posso, não devo. Já tingi meus lábios, agora serei pedra. Vou me afundar e afundar. Nade até não ter mais sangue, então me engula e criaremos um novo mar!




João Paulo Capovilla Francischini 14.05.2012


sábado, 12 de maio de 2012

Minhas Putas em vermelho - Onde começa o céu


O céu estava vermelho.
O cabelo de Elizabeth era escarlate
Seu olhar negro e sereno.

Deitada no mar de grama que dividia o sonho com a realidade
Elizabeth se misturava com a paisagem assim como a inventara.

Balbuciava a história da primeira prostituta em vermelho : 
Prima Vermelha, prostituta que vivia no Reino Unido dos anos 80.
Naquele dia nevava muito, algumas flores sem nome ou cor cortavam o vento que as cortava.
Era seu sétimo programa do dia, se sentia exausta e sem cor alguma que a definia.

James Clerk, fotógrafo, era seu cliente preferido. O mesmo que deitado no sofá estava com ela.
Ele pagara por um programa pois tinha acabado de inventar a fotografia colorida,
Estava tão alegre que Prima jurava que sentia sua excitação em suas gemidas.



James quis experimentar  primeira foto com Prima. 
Ela não quis no começo, porem foi pega de surpresa sendo arrumada pelo Sr. Clerk.
De dorso nu, calcinha quase que brasileira ela foi posta ousadamente no sofá.

No tempo em que ela esperava pelo click, pensara sobre sua vida.
Enlouqueceu nos segundos que estava estática,
E quando finalmente o botão afundou, ela berrou para o mundo abafado ouvir.
Tacou fora tudo que tinha, em um berro fascinantemente surdo.

James sabia que era tarde agora a primeira foto colorida já tinha saído.
Ao revelar-la deu um pulo para trás. Era coloridamente desconhecida, era vermelho, era viva!
A foto pintou o vermelho das flores que nao se conheciam,
Gritava calorosamente o nome daquelas mortas e esquecidas.
Fez-se sangrar a neve aquela noite, pois Prima Vermelha se deu por vencida
Vencida pela cor vermelha, pela paixão que queimava nos gemidos, pelo fogo que aquecia os esquecidos.
E assim nasce aquarela vermelha, que de tão sólida se tornou centelha no coração dos que pela vida 
Foram vencidos e por fim renasceram.

Voltando ao mar verde, Elizabeth falou algo que ressoava nos seus cabelos escarlate
Ela disse:
Semanas e semanas passei neste mar para descobrir onde começa o céu 
Pensei, enlouqueci.
Mas sei que o céu começa ao pularmos, e termina nos meu cabelo escarlate.
Ele pode sangrar, formar rios de sangue enquanto os penteio.
Mas o céu la de cima 
Sangra a primeira puta em vermelho.

 

João Paulo Capovilla Francischini 12.05.2012




quarta-feira, 2 de maio de 2012

Liberte seus sapatos, cuidado onde anda.


Aquele sentimento de estar quase escapando, 
E mesmo com as mãos sangrando não deixar escapar 
E no fim implacável, cair de rosto no chão áspero,com lagrimas a soltar. 
Era isso minha triste definição de amor,
Me custou muito a informação de que não mais devo segurar. 
Devo de todos meu medos, meu amores, me soltar e acompanha-los como um gentil dono a caminhar. 

 Esses dias atrás caminhei com um desses cachorros mestiços, 
Passamos pela cozinha, passamos pela sala de jantar. 
Os convidados postos a mesa, elegantes trajes de gala a brindar. 
Brindavam algo como prosperidade e dinheiro, 
Meu cão abanou o rabo e começou a rosnar. 
Ao invés da coleira por, deixei-o latir e quando era o ápice de meu temor, comecei a dançar. 
Mistos de valsa e tango fluíam de meus pés, 
Perigosos como tiros de foguete em conjunto com um beijo ardente.
Era como se cada passo explodisse o chão, ou talvez fossem meus sapatos. 
Que nobres e únicos passos aquela noite eu dancei... 
Enquanto todos olhavam perplexos -Quem é este palhaço ? 

Quando dei por mim estava no espaço,
Brilhando junto aos astros, sorrindo em conjunto com a lua. 
Senti as ondas do Sol, mas não estava no mar. 
Ouvi o barulho do céu atormentador a se aumentar e aumentar. 
Então houve o puxão, desci desci desci ate o chão.
Estava lá eu estático no piso de meu palácio, 
Procurando no meu único maço o ultimo cigarro para acender,
Enquanto ouvia dizerem em alto e bom som: - humpf, mas que garoto problemático ... 

 A chama se ascendeu e o mundo se tornou simpático.


 


João Paulo Capovilla Francischini 02-05-2012